sábado, janeiro 07, 2006

Bem-vindos à muamba e afins

Postado por Elisandro Borges

Cadê o sol? Olhei pra trás e ainda tava escuro. Não, na verdade era a janela. Foi só abrir a porta que era visível o azul bem mais claro, o oposto da noite. Tá lá a cidade, as pessoas empilhadas umas em cima das outras em seus compactos apertamentos. Dizem que esses prédios arranham o céu. Parece que é verdade, olha só o tanto de marca que ficou nele. São 6:30 da manhã – que horário mais lindo! Todo o mundo fica mais bonito de olhos fechados e em silêncio nessa hora. Só dá pra ouvir os ônibus circulando, esses sim; são como galos, começam às cinco. O frio da manhã fresca é tão limpo, que só pode ter sido purificado mesmo, dá até vontade de beber o vento que desliza no rosto. Chega, tentei ser poético, mas não vai dar não. Vamos ao que interessa: fazer um singelo comentário dos trabalhadores, dos muambeiros, dos sobreviventes e por que não dos talentos duvidosos?

Não sei por que, mas como morador do centrão há 20 anos, muitos desses centros lembram qualquer coisa dantesca por falta de outro vocabulário mais adequado. Onde há muamba, sempre existe uma muvuca, um aglomerado de pessoas se esbarrando umas nas outras, mães arrastando os pequenos-grandes-fedelhos berrando pelo brinquedinho eletrônico quase que o triplo do salário da própria; camelôs vendendo cds do “O Rappa” a um real e gritando ao mesmo tempo: “olha o raaaapa!” – é neguim correndo com caixa de papelão na mão, atropelando tudo... fazendo aquela farova pra fugir do fiscal. É o carro da pamonha com seu super merchandising: “olha a pamonha, olha a pamonha! Pamonha de sal, pamonha de doce, pamonha à moda, pamonha para todos os gostos, aqui, no carro de som”. Só falta agora aparecer o carro da maconha: “olha a maconha, olha a maconha; maconha prensada, maconha enrolada, maconha de menta, maconha para todos os gostos! Aqui, no carro de som”. É vendedor ambulante com a mão abarrotada de óculos de “grife” a cinco reais suando pra tentar liquidar o estoque da caixa que trouxe no lombo, e por aí vai.

O brasileiro e seus pulos; o brasileiro, aquele capaz de espremer dinheiro de uma laranja enquanto o dono do boteco da esquina consegue sobreviver vestido de Ronaldinho pra ver se dribla o leão da receita no fim do ano. Fora tantos “crochês” no comércio, cheques pré-datados, cheques sem gravidade – os voadores mesmo. É rebolando que o país ganha o pão. Alguns ou algumas ainda levam ao pé da letra e literalmente rebolam pra sentir o gosto do trigo. Falaram tanto de dinheiro na cueca, de Valerioduto, de subornos, da grande e previsível corja política e da indignação também de praxe por todos os cantos do país. Sabe, isso pode até ser talento, tamanho é o talento – duvidoso ou não – que até Deus estranha a criação.


Ouça em alto e bom som: Spoon - I Turn My Camera On
Post saído do forno às 09:27am

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  1. Anônimo Says:

    tewte