sexta-feira, junho 25, 2004

Sonho, deserto e fuga

Postado por Elisandro Borges

*O nome do personagem é fictício, mas tentei relatar na forma de um conto, o que aconteceu com um amigo meu ao atravessar a fronteira do México com os EUA.

“Corra! Não olhe para trás!” Ele deixou tudo o que tinha em mãos, jogou a garrafa d’água e a mochila fora, sem rumo, ele correu como nunca... Estava escuro e o deserto era muito vasto. Carlos era sinônimo de puro impulso naquela hora. O instinto de sobrevivência falou mais alto e suas pernas ganhavam chão sem fim. Não havia nada em seu coração, apenas medo e taquicardia. Os gritos de tormentos dos colegas ao redor o faziam disparar ainda mais. Salve-se quem puder. Esse era o lema. A polícia da fronteira estava escondida e surpreendeu o grupo a poucos passos do sonho americano. A travessia no deserto do México estava para chegar ao fim. No entanto, nada o fazia parar de correr. Tudo o que ele possuía agora era uma calça dilacerada e a camisa rasgada pelos arames farpados que esbarrou durante o caminho. Em seu bolso, apenas documentos, mais nada. Sua sorte fora entregue.

A poucos metros de sua frente, avistou um outro homem correndo em desespero. E por incrível que pareça, aquele era um dos coiotes que o guiaria mais tarde. Dessa vez, Carlos foi o escolhido, ele finalmente alcançou o homem e pôde ter certeza de que era a pessoa certa. Dali para frente, sua alternativa era tentar encontrar forças para continuar. O sol começou a clarear o deserto. Não havia mais ninguém por perto. Nesse momento, o maior inimigo era o calor causticante. Areia por todos os lados, cansaço, sede, desesperança... Sem contato algum com o mundo, ele seguia em frente buscando um sinal de vida. Suas energias eram injustamente desproporcionais ao espaço que ainda faltava percorrer.

O seu organismo não tinha líquido sequer para uma lágrima. Ele já estava quase que implorando a Deus para ser pego pelos policiais, pois ao menos assim teria água para beber. Foram horas a fio de muita luta e sofrimento. Carlos conseguiu superar seus próprios limites. Sua fé o manteve vivo e a necessidade de atingir um norte em sua vida foi dominante. O coiote encontrou o caminho de volta e por um milagre atravessou aquele homem de 32 anos. Hoje, Carlos pisa em terras menos inóspitas e é supervisor em uma central telefônica na qual trabalho, em San Francisco, Ca. Exemplo de força, perseverança e humildade. Um ideal levado às últimas conseqüências.

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